sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Um Charlie Hebdo à brasileira


Humberto Silva de Lima
Opinião


É interessante observar toda a atenção dispensada ao atentado contra o jornal Charlie Hebdo, ocorrido no dia 07 deste mês. Trata-se de um acontecimento marcante, que reforça um tipo de discurso apocalíptico que põe medo na Europa e, por empréstimo a juros compulsivos e/ou convulsivos, se levarmos em conta o olhar midiático da TV Globo, no Brasil.

A França tem todas as condições para falar de tudo e de todos, sendo o berço dos reclames igualitários e democráticos, que são muito mal interpretados por aqui. Lá, fala-se desde o Papa até Maomé. Aqui, canais de humor tupiniquim ainda não têm coragem para tal. Na RedeTV (canal 6 do RJ ), o pastor neopentecostal Marcos Feliciano disse que processou o canal de humor no YOUTUBE "Porta dos Fundos" - hoje com um grande sucesso no sistema GLOBOSAT -  porque os artistas desse canal fizeram um humor depreciativo à figura de Jesus e de Maria. O pastor havia proposto ao canal o porquê de não fazer sátira ao profeta Maomé, e eles responderam que não queriam que a casa deles fosse bombardeada. Isso pode ser uma piada, mas pode carregar um discurso do politicamente correto que eles mesmos, os do "Porta dos Fundos", não conseguem vencer, e isso é uma desordem moral para todos os lados: os fingidores / conservadores atualizados à Machado de Assis  - a figura do pastor e de muitos (neo)pentecostais, por exemplo - e  os anarquistas que acham que podem falar de tudo e de todos como bem entendem.


Vivemos um tempo de censura velada por todos os lados. Todos querem rir, mas não querem pagar o preço. Houve até boatos (ou verdades) de que a cúpula do governo federal estaria disposta a cortar as verbas publicitárias em algumas mídias do Grupo Globo de Comunicação. Parece que a ideia de falar mal da Dilma é um péssimo negócio.


É difícil manter na França e, principalmente, no Brasil um estilo Charlie Hebdo. Aqui, acredita-se que as pessoas confundem liberdade com libertinagem. Na verdade, a censura nunca nos abandonou. Nossa democracia é míope. Vivemos o tempo todo com o maldito discurso da hipocrisia sem sabermos disso ou não. Estamos em um "quadrado" que exige ser quebrado em todo o momento, mas fechamos os olhos para isso. Como os tempos sombrios nos esperam, "é preciso ficar atento e forte, não temos tempo de temer a morte".